Quando realizou, em 2011, o concurso público para ser professor de geografia pela rede municipal de ensino na cidade do Rio de Janeiro, Breno Mendes, 31, ficou em terceiro lugar entre 1.900 candidatos. Na prova prática de aula, tirou nota 100, nota máxima. Mas três anos após começar a lecionar, ele acabou demitido do cargo. O motivo apontado pela Secretaria Municipal de Educação (SME) foi o comportamento do professor em redes sociais.
No processo administrativo que acarretou na demissão (publicada em Diário Oficial), há a acusação de que o professor teria ferido o código de ética do funcionário público ao realizar críticas públicas no Facebook. De acordo com o texto do processo, Breno transgrediu, dentre outros, um artigo que aponta como dever do funcionário público "lealdade e respeito às instituições administrativas que servir".
Breno acusa a Secretaria de Educação de censura. "A demissão não [é] por motivos trabalhistas e, sim, políticos. Decidiram, por meio de uma Lei da Ditadura [o artigo em que ele foi enquadrado é de 1979], que não posso criticar a Prefeitura e me demitiram", diz.
O professor, que estava na Escola Municipal Padre Manuel da Nóbrega, no Complexo do Alemão, argumenta que o conteúdo online não influenciava no trabalho. "Os textos eram redigidos em minha casa, fora do local de trabalho, exercendo meu direito constitucional de expressão. Nada tinham a ver com minha atuação como professor. Não havia relação entre minhas opiniões virtuais e meu dia a dia na escola", diz
O Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (Sepe/RJ), que prestou assessoria jurídica ao professor, diz que vai tentar reverter a decisão: "A direção está conversando com a secretaria e o jurídico verificando as possibilidades. A crítica, ainda que ácida, faz parte da dinâmica de qualquer Estado que aspire ser democrático e direito", afirma o sindicato em nota.
Até o momento, a Secretaria disse que a decisão da demissão está mantida e que não cabe recurso. O órgão também afirmou, por meio da assessoria, que é comum professores em estágio probatórios não serem efetivados: "Há um conselho que julga se ele é apto ou não. O comportamento em redes, inclusive com ofensas, fez dele inapto ao trabalho por não ter a postura adequada".
A reportagem do UOL pediu para conversar com a atual secretária municipal de Educação, Helena Bomeny, mas a assessoria apontou que ela não tinha agenda para falar sobre o assunto. A direção da escola em que Breno dava aula também não quis comentar o caso.
Reprodução da página Cariocaativismo Social do professor Breno Mendes
Entrevista ao vivo e processo acirraram relação
Os problemas entre o professor de geografia e o Executivo começaram logo após ele ser escalado para dar aulas de história e português, no início de 2013. "Pedi inspetores para o corredor e livro para as aulas. Ouvi que não existia e que não havia. Ser obrigado a dar outras aulas me fez tomar uma posição mais radical contra o sistema", conta.
Breno diz que passou a ser mais conhecido e visado após falar sobre a educação no Rio em uma entrevista ao vivo do prefeito Eduardo Paes para a rádio Band News em 2013. À época, perguntou se o prefeito colocaria os filhos para aprender português com um professor de geografia. "O meu problema eu resolvi e voltei a lecionar geografia. Mas aí comecei a sentir que passei a ser observado. Virei flecha e virei alvo", conta.
Postagens criticando a postura da Secretaria Municipal de Educação e o prefeito passaram a ser tornar mais frequentes. Em uma delas, Breno dizia que a SME teria conseguido piorar o "impiorável". Em outra, ele mostra duas fotos: uma de apostila de geografia com informações erradas e crianças criando uma bola de futebol com ela. No comentário, ele apontava que "as crianças sabiam reciclar lixo".
Em agosto de 2013, os professores do Rio de Janeiro estavam em greve e realizando manifestações quase que diariamente. Uma foto de Breno tirada durante um protesto também foi anexada ao processo que seria aberto logo após o fim da greve daquele ano. "Quando acabou a greve, colocaram minha cabeça a prêmio", diz.
Além do processo por causa das redes, Breno quase foi demitido por causa da greve. "A Prefeitura do Rio de Janeiro tentou me demitir por causa da greve, mas perdeu na Justiça e ainda foi condenada a devolver os descontos", conta.
A relação entre professor e secretaria piorou ainda mais com o tempo. Postagens reclamando não só da da SME e do prefeito como do processo passaram a ser mais frequentes após a criação da página Cariocaativismo Social. "Chegavam a alcançar até 100 mil pessoas", conta. Breno também criou um abaixo-assinado na tentativa de voltar a dar aula na escola municipal. O documento já soma 4,6 mil assinaturas.
Toda a pressão online de nada adiantou. Breno, que lecionou pela última vez no dia 29 de abril, não está desempregado porque também é professor da rede municipal de Petrópolis, mas afirma que deseja voltar a dar aula no Rio: "Quero voltar pelo meus alunos. Eles pedem por aula quando me veem. Quero ficar na escola que estou. Apesar de ser uma das piores da cidade nos índices de educação, quero voltar pelos alunos", afirma.
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